O dia em que Villa Lobos realizou um concerto em Botucatu no Teatro Spéria
Em agosto de 1931 o Maestro Heitor Villa Lobos realizou um concerto em Botucatu no antigo Teatro Spéria, no dia 14. O maestro chegou à cidade de trem e foi recepcionado na antiga Estação da Estrada de Ferro Sorocabana.
O concerto na cidade dos bons ares e das boas escolas incluía, além da audição no Cine Teatro Espéria, encontro com professores e alunos do Colégio Santa Marcelina (que na época se chamava “Dos Anjos”) e ainda uma conversa, com professores e alunos da Escola Normal (atual (EECA).
A presença do ilustre maestro fez parte da Caravana de Artistas Heitor Villa Lobos, que excursionou pelas cidades do Estado de São Paulo e tinha como lema: “propagar a música brasileira pelas cidades do interior”.
Conforme artigo do historiador João Carlos Figueiroa no site Ybitucatu “o Maestro Heitor Villa Lobos, alimentava o cotidiano com suas composições baseadas em temas nacionais, seus hinos revolucionários e suas harmonizações tupiniquins. Converteu-se numa referência para os músicos e intelectuais do país”.
A vinda do maestro foi um trabalho árduo que teve como grande incentivador o professor de música da Escola Normal, Alfredo Franklin de Mattos, sendo ele também o responsável pela recepção do artista.
Os preparativos começaram em janeiro com atividades diversas para preparar o público para o grande momento com ensaios entre alunos e a apresentação do trabalho do artista em salas de aula. Além do destaque que a imprensa da época passou a dar para o músico e a vinda dele para a cidade.
“…esse genial artista patrício compreendeu a necessidade que tem o Brasil de mostrar o que possue em arte musical…a nossa gente tem a sua música, porém como bem já disse Villa-lobos, ella a desdenha para dar entrada à música “yankee”, que se vem infiltrando em nossa sociedade atravez dos “charlestons e black-bottons”, escreveu o jornalista Nelson F. de Mattos no Correio de Botucatu.
Já a estrutura para a recepção, porém, começou a ser pensada e preparada apenas em junho daquele ano , quando os ensaios ganharam os palcos de clubes recreativos e de baile, principalmente no Gabinete Literário e Recreativo, antigo prédio da Rádio Emissora de Botucatu.
O Gabinete “recebeu a primeira leva de estudantes para o início dos ensaios, do que seria chamado “o maior coral que Botucatu teria visto: Octavio Vaz Camargo, Lourenço Dias Machado, Antonio Popolo Netto, Benedicto Jordão, Mario de Campos Leite, José Pereira de Andrade, Antonio P. Machado, Sebastião Oliveira, Manuel Ferreira Dias, Humberto Funari, Juventino Xavier, Antoninho S. Freitas, Alberto Losi, Antonio Spencieri, Alcântara Rodrires, Junil Pegnelli e Nelson Mattos”, relembra o historiador no site Ybitucatu.
Sem dúvida nenhuma a presença do maestro em Botucatu e seu concerto pode ser considerado como o evento mais representativo da cidade em 1931, todo o mês de julho foi dedicado aos preparativos. Era necessário deixar tudo pronto para a chegada do maestro, que estava programada para a tarde de 14 de agosto.
Estava tudo preparado, e na naquela tarde de agosto de 1931, a Estação da Estrada de Ferro estava lotada, repleta de autoridades, entre elas Figueiroa cita em publicações e no siter: “O centro tenentista – no comando da cidade, com Damião e Leônidas à frente, um contingente enorme de alunos e duas comissões que “acompanhariam os artistas a todos os lugares”: professoras Arminda Roubaud, Olga Martins, Iracema Martins, Maria Dinucci, Alice Vilas Boas, Nícia Camargo, Isabel Torres, Carula Torres,. Jenny Pinheiro Machado e o senhores, dr. Antonio Fernandes Villas Boas, prof. Salvador Assumpção, dr. Luiz Duprat, Trajano Pupo, prof. Gastão Pupo, prof. Genaro Lobo, prof. Afonso Celso Dias, prof. Pedro Leonel, prof. Silvio Galvão, dr. Sebastião de Almeida Pinto, prof. José Amaral Wagner, prof. José Martins, Francisco Reis Baptista, Euclides Pinto da Rocha, padre Salustio Machado e o jornalista Deodoro Pinheiro Machado”.
Os ingressos para a única apresentação no Teatro Spéria esgotaram rapidamente, com dias de antecedência. A lotação, que era de 300 pessoas, já marcava o sucesso do concerto. Nesse dia as entradas já estavam todas esgotadas.
A apresentação atingiu todos os objetivos, os jornais da época repercutiram o show logo no dia seguinte, registrando o que seria a última grande sessão daquele teatro: “Villa-lobos no violoncelo e nas impecáveis composições; Souza Lima, o pianista sublime; sra. Nair Duarte Nunes, interpretando docemente canções lindíssimas; e a sra. Lucillia Villa-Lobos, com o seu extraordinário acompanhamento ao piano – todos enfim souberam empolgar a platéa que, por sua vez, consagrou com os seus aplausos sinceros, enthusiásticos e frenéticos, os executores do magnífico programa”, apontava o jornal Correio de Botucatu.
Mas engana-se quem pensa que Villa Lobos foi embora logo após a apresentação, o maestro ficou dias na cidade, visitou jornais e escolas.
No dia seguinte ao concerto o maestro visitou o Colégio dos Anjos, e prestigiou a apresentação do coral de alunas do Santa Marcelina, aproveitou ainda para discursar.
Já no dia 17 de agosto ele compareceu ao salão nobre da Escola Normal, atual EECA, onde também prestigiou a apresentação do coral ensaiado pelo professor Franklin, sendo tomado de surpresa por discursos dos “professores Wagner , Architiclinio dos Santos e dos alunos Adolpho P. Machado – em, nome do Grêmio 16 de maio e da senhorita Leontina Cardieri. Falou ao final… “ incitando a mocidade normalista a colaborar na sua obra patriótica”, cita o historiador ao site.
Villa Lobos partiu de Botucatu no dia 19 de agosto, porém tomou o trem de volta para Botucatu em setembro, para visitar o professor Franklin de Mattos, onde permaneceu por dois dias.
Nessa visita o maestro estava acompanhado de sua esposa, Lucilla Guimarães Villa Lobos. Visita que rendeu uma nota no Correio de Botucatu: “Seguiram ante hontem (13/09), com destino à capital do Estado, o senhor Heitor Villa-Lobos, exímio compositor brasileiro, e sua digna senhora. Durante o dia de domingo último o grande artista executou na residência do senhor professor Mattos, diversas peças ao violoncelo, com a presença de diversas educandas do Collegio dos Anjos”.
Por Renato Fernandes