Guerra Rússia-Ucrânia: o panorama do abastecimento de fertilizantes
A escalada dos custos de fertilizantes já vinha acontecendo em 2021, mas a escassez desses produtos no mercado internacional, desde o início dos ataques da Rússia à Ucrânia, em 24 de fevereiro, provocou a disparada nos valores praticados, elevando os custos da produção agrícola em todo o País, que importa 85% dos fertilizantes que utiliza na agricultura, segundo a Associação Nacional para Difusão de Adubos (Anda).
Cláudio Silveira Brisolara, gerente do Departamento Econômico da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo (FAESP), explica que, dada a incerteza sobre o cenário do fornecimento de fertilizantes, os produtores tendem a antecipar os negócios, o que eleva a demanda, por receio do desabastecimento, e isso provoca uma especulação sobre o valor do insumo. “Os preços estão disparando nas revendas do interior do Estado. A princípio o produto existe, mas a especulação ocorre porque alguns agricultores estão tentando antecipar a compra, pensando na próxima safra de verão e a diferença nos custos já se faz sentir”, diz. Segundo ele, já se percebe um aumento médio entre 20% e 30% nos preços. “É preciso ter cautela na compra, fugir de ações especulativas”, alerta.
Mesmo que os problemas de fornecimento venham a ser sanados a curto prazo, já não há como impedir o impacto econômico imediato. A falta de insumos prejudica a programação das safras que terão início nos próximos ciclos sazonais, pois a produção e a logística das exportações de fertilizantes já está sendo comprometida. Para o próximo ciclo de soja, por exemplo, em setembro/outubro, o produtor não sabe como ficará a situação. Em depoimento publicado no site do Ministério da Agricultura, a ministra Tereza Cristina declarou que o Brasil tem quantidade suficiente desses insumos, seja para o milho safrinha, cultivo que será plantado agora, ou para trigo, a partir de abril. Isso daria uma segurança até o início da próxima safra, no segundo semestre, mas se o fornecimento não for regularizado até lá, a situação vai se complicar. Segundo a Anda, o Brasil tem estoques suficientes até o começo de junho e em volume acima da média de anos anteriores.
Boletim divulgado há alguns dias pela FAESP, a partir de informações do Instituto de Economia Agrícola da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo (IEA-SAA/SP), aponta para um cenário difícil para os produtores, pois os insumos vêm de uma escalada de preços no ano anterior. No acumulado de 2021, os aumentos foram expressivos: sulfato de amônia (+148,35%), superfosfato (+145,72%), calcário (+53,06%) e Formulado 20-05-20 (+173,31%). Portanto, os custos que já estavam altos ficarão agora ainda mais elevados.
Medidas governamentais
A Rússia, sozinha, representa 23% da importação nacional de fertilizantes – dados referentes a 2021 do Comex Stat, sistema para consultas e extração de dados do comércio exterior do Ministério da Economia. Dos três elementos considerados mais importantes para as necessidades das plantações – representados pela sigla NPK (nitrogênio, fósforo e potássio) –, o Brasil depende ainda do mercado externo para suprir os últimos dois, em especial o potássio, em razão das poucas fontes naturais em solo nacional.
Brisolara aponta que a FAESP busca fazer, neste momento, gestões de nível macro, pleiteando ações, principalmente do governo federal, a fim de viabilizar importações de outras fontes. “É o que a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, está fazendo”, afirma. Em 14 de março, ela esteve no Canadá em reunião com representantes de empresas daquele país para debater o atual momento pelo qual passa o setor. Uma dessas empresas, a Canpotex, informou que deve aumentar o volume de vendas para o Brasil. Outro país que acena com a possibilidade de promover maior exportação desses insumos para o Brasil é o Irã. Aquele país vendeu para o Brasil, no ano passado, quantidade recorde e é um dos maiores compradores do milho brasileiro, segundo o embaixador do Irã no Brasil, Hossein Gharibi.
Em 16 de março, em reunião com representantes das Nações Unidas e dos governos de diversos países, a ministra Tereza Cristina defendeu que os fertilizantes sejam excluídos do regime de sanções impostas à Rússia, a exemplo do que ocorre com os alimentos. O objetivo é reduzir o impacto da escassez e do aumento dos preços, a fim de impedir a queda na produção de alimentos.
Em 11 de março, o governo federal lançou o Plano Nacional de Fertilizantes, que pretende elaborar um planejamento para o setor para os próximos 28 anos, a fim de readequar o equilíbrio entre a produção nacional e a importação, e atender à crescente demanda por produtos e tecnologias.
SENAR-SP ensina técnicas
O gerente do Departamento Econômico da FAESP aponta que a entidade está articulando com o SENAR-SP para, se for o caso, reforçar a aplicação de programas que já existem em torno da utilização racional de fertilizantes e do uso de biofertilizantes, visando a maior eficiência de aplicação e a eventual substituição dos adubos minerais, além de outras técnicas agronômicas, como a adubação verde. “Isso tem um limite, não é fácil, mas sempre ajuda. Por exemplo, a aplicação de compostagem em locais em que isso seja viável”, comenta. Os programas do SENAR-SP também ensinam técnicas da agricultura de precisão, com a racionalização do uso de fertilizantes e outros insumos. “Ou seja, incrementar a eficiência dos insumos para diminuir o volume a ser utilizado. Isso porque, talvez, não tenhamos a mesma disponibilidade a que estávamos acostumados nas safras anteriores”, conclui Brisolara.
Outras informações acesse o Portal FAESP/SENAR-SP