Algodão ensaia retorno ao Paraná
No final do primeiro semestre deste ano, o produtor e engenheiro agrônomo Leandro Yuji Izu, de Assaí, na região Norte do Paraná, abriu, junto a um sócio, uma empresa de consultoria voltada para agricultores que tenham interesse em cultivar algodão. A empresa surge 30 anos depois do auge da cultura no Estado, em um novo contexto. No passado, o Paraná chegou a ser o maior produtor nacional da fibra. Mas, no início da década de 1990, a voracidade do bicudo-do-algodoeiro (Anthonomus grandis) e problemas de ordem climática levaram os cotonicultores a trocarem a pluma pela soja, que começava a se firmar nas lavouras paranaenses.
Com a tecnologia de cultivares mais consolidada e o bicudo sob controle, a pluma ensaia seu retorno ao Paraná, mesmo que ainda de maneira tímida. De acordo com a Associação Brasileira de Produtores de Algodão (Abrapa), na safra 2018/19 foram plantados 700 hectares no Estado. Na safra seguinte, 2019/20, essa área passou para 1,2 mil hectares e, no último ciclo (2020/21) reduziu para 800 hectares. Essa inflexão tem explicação no mercado internacional, no qual as cotações da soja e do milho se mostram bastante atrativas.
“O momento é excepcional para grãos. Ano passado a soja ocupou mais área, mas conforme a safra avançou, o preço do algodão também subiu”, observa o presidente da Associação dos Cotonicultores Paranaenses (Acopar), Almir Montecelli.
Não apenas subiu, como ficou acima das culturas concorrentes. De acordo com o levantamento do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), vinculado à Esalq/USP, nos últimos dois anos o preço da arroba da pluma de algodão mais do que dobrou, passando de R$ 83,06 em outubro de 2019 para R$ 172 em setembro de 2021. Para efeito de comparação, durante o mesmo período o preço da saca de soja passou de R$ 88,25 para R$ 172,02, registrando variação menor em relação ao algodão.
Ainda segundo informe técnico da Acopar, o desempenho do algodão na safra 2020/21 em relação à de soja mostra que a rentabilidade do primeiro foi maior. “O algodão caracterizado como plantio safra normal, como cultura de verão, resultou em rentabilidade de R$ 17,4 mil [por alqueire] na média de 11 lavouras [acompanhadas pela entidade]. Porém, o resultado foi muito maior considerando as quatro lavouras mais produtivas. Nestes casos, a margem líquida subiu para R$ 25,5 mil”, aponta o documento.
Produtividade
Essas cifras ainda podem melhorar. Isso porque a produtividade média do algodão paranaense está abaixo de outros Estados produtores. “O Paraná tem colhido uma média de 206 arrobas/hectare. No Brasil, 290 arrobas/hectare é o mínimo que se admite”, diz o dirigente da Acopar. A explicação está no custo de produção inferior no Paraná em relação ao resto do Brasil. “Aqui o custo de implantação da cultura é menor. Fazemos zero aplicação de fungicida, enquanto no restante do país são de sete para cima”, diz Montecelli.
Desta forma, implantar uma lavoura em solo paranaense custa entre R$ 12 mil a R$ 14 mil/hectare, enquanto praticamente dobra, algo em torno de R$ 25 mil/hectare, em outros lugares. Além disso, de acordo com a Acopar, a média de aplicações de inseticidas no Paraná é de 11,7, sendo cinco somente contra o bicudo. Na região do Cerrado brasileiro, onde há grande produção da pluma, esse número passa de 24 aplicações, sendo 19 somente para controle da praga.
Outra vantagem do algodão paranaense, segundo Montecelli, é que as nossas lavouras são as primeiras a serem colhida. “Então sempre tem mercado e preço bom”, sentencia.
Aliado do solo
O algodão traz vantagens quando utilizado na rotação com outras culturas, como a soja e o milho, interrompendo ciclo de pragas e doenças na lavoura e otimizando a absorção de nutrientes. Na empresa de consultoria de Izu, esse é um dos maiores chamarizes para novos cotonicultores. “Estamos tentando mudar a cabeça do produtor para ele incluir essa rotação, incutir no pensamento dele a importância de corrigir o solo. Uma das maiores propagandas da nossa empresa é a rotação do algodão”, afirma.
Izu prega aquilo que faz. Na última safra verão, ele rotacionou soja, algodão e milho. Neste ano, o produtor obteve rentabilidade de R$ 29 mil/hectare com as lavouras de algodão, R$ 8,7 mil com o milho e R$ 6,2 mil com a soja. “Foi o melhor verão desde que eu voltei do Cerrado para o Paraná em 2017”, comemora.
Versátil, cultura precisa ganhar escala no Paraná
O algodão tem dois produtos: a pluma, destinada principalmente à confecção de fios e tecidos, e o caroço, utilizado como alimentação animal e pode ser transformado em óleo. No cenário atual, em que os custos de produção de ração acompanharam a valorização expressiva das commodities agrícolas como soja e milho, esse insumo também se valorizou.
“Houve uma boa valorização [do caroço]. No primeiro contrato que fizemos com a beneficiadora de São Paulo, não estávamos preocupados com isso. O caroço pagava o beneficiamento e sobrava”, aponta o produtor e presidente do Sindicato Rural de Cambará (Norte Pioneiro), Aristeu Sakamoto.
Até o ano retrasado, a beneficiadora paulista ficava com o caroço em troca do serviço. Porém, no ano passado, metade do caroço pagava o beneficiamento. No final de setembro deste ano, a tonelada do caroço de algodão era comercializada nas praças paulistas acima de R$ 2 mil. “Praticamente dobrou de valor”, observa Sakamoto. Um “amante do algodão”, como ele mesmo se define, o dirigente sindical viveu a primeira fase da cultura no Paraná, há 30 anos. Sobre o momento atual, ele recomenda cautela.
“A ideia de retorno do algodão tem que fazer com pé no chão. Hoje temos parceria com Instituto Brasileiro do Algodão e a Acopar, que foram buscar parceria com o pessoal do antigo Iapar, para assistência técnica, e também da Embrapa. Estamos bem assessorados, ampliando a rede de assistência técnica. Acho que esse trabalho vai aos poucos crescendo e criando mais oportunidades para as cooperativas se interessarem pela cultura. Mas vamos com calma, ainda tem alguns gargalos a serem resolvidos”, observa Sakamoto.
Dentre os gargalos que precisam ser superados está a ausência de indústria beneficiadora em território paranaense. Na última safra, toda a produção do Estado foi encaminhada a uma descaroçadora em São Paulo. Na visão do presidente da Acopar, Almir Montecelli, o caminho para solucionar essa questão seria aumentar a produção dentro do Estado, de modo que viabilizasse a existência de uma indústria de beneficiamento em solo paranaense. Para atingir esse objetivo, uma das estratégias da entidade é fomentar o cultivo por meio de assistência técnica. “Hoje temos 10 unidades demonstrativas voltadas a produtores e técnicos interessados em conhecer a cultura”, afirma. Na opinião do dirigente uma área de 20 mil hectares seria suficiente para abastecer o Estado.