Artigo Sueme Mori: Ponte para o Oriente Médio*
Em julho do ano passado, o Centro Nacional de Meteorologia dos Emirados Árabes Unidos divulgou o vídeo de uma chuva artificial, em Dubai, provocada por uma tecnologia de “semeadura de nuvens” com drones. O objetivo é amenizar o calor que chega a quase 50 graus na região. Resultado de anos de pesquisa e muitos milhões de dólares, a imagem viralizou nas redes sociais.
A baixa disponibilidade de chuvas é um problema que afeta vários países do Oriente Médio e provoca impacto direto na capacidade de produção agropecuária da região. A média anual de chuvas nos Emirados Árabes Unidos é de cerca de 100 milímetros; como comparação, no Brasil, esse número está perto de 1.800 milímetros.
Além do baixo índice pluviométrico, a pouca disponibilidade de terras agricultáveis e o clima desértico fazem com que diversos países da região dependam da importação de alimentos para garantir o abastecimento interno. Os Emirados Árabes Unidos importam 80% dos alimentos que consomem, o Catar, 83%.
Essa dependência externa faz com que a segurança alimentar seja um tema crítico para os países da região. Governos locais possuem estratégias de médio e longo prazo para garantir que não haja desabastecimento. Cientes de que mesmo com o aumento da produção local, a importação ainda continuará sendo fonte imprescindível de fornecimento, há um esforço generalizado para o fortalecimento da cadeia de suprimento que abastece a região.
No centro da Estratégia de Segurança Alimentar dos Emirados Árabes Unidos, por exemplo, está a facilitação do comércio global agropecuário e a diversificação de países fornecedores. A meta do país é alcançar, em 2051, a primeira posição no Índice Global de Segurança Alimentar. Atualmente, eles ocupam o 31º lugar.
No início da pandemia sanitária mundial, diversos países impuseram restrições para a exportação de alimentos, com receio de desabastecimento interno. As cadeias de suprimento foram colocadas à prova (e ainda estão). Diante desse cenário adverso, o Brasil se mostrou um fornecedor confiável e não só manteve como ampliou suas vendas externas de produtos agropecuários.
Para países altamente dependentes da importação de alimentos, estabelecer uma rede de fornecimento confiável e resiliente está no topo da lista de prioridades.
A preocupação é genuína e se torna ainda mais importante quando se considera o crescimento populacional dos países. Entre 2000 e 2020, o número de habitantes do Oriente Médio cresceu mais de 50%; nos Emirados Árabes Unidos, esse aumento foi de mais de 200%, um salto de 3,1 milhões para 9,9 milhões de pessoas; considerando o mesmo período, a população da União Europeia aumentou 4% e do Brasil 22%.
Com uma produção local extremamente restrita, há oportunidades para diversos setores. Em 2019, por exemplo, todo o arroz consumido na Arábia Saudita foi importado. No caso dos limões, o volume adquirido externamente foi mais do que o dobro do produzido localmente. Para a carne bovina, a quantidade importada foi mais do que o triplo da produzida no país.
Como o terceiro maior exportador de alimentos mundial, esse cenário se apresenta como uma oportunidade para o Brasil tanto para as empresas que já exportam quanto para as que desejam entrar no mercado internacional.
Atualmente, somos o segundo principal fornecedor de alimentos para o Oriente Médio, atrás apenas da Índia. No ano passado, exportamos cerca de US$ 7,2 bilhões em produtos agropecuários para a região, com uma pauta muito concentrada, sendo carne de frango, açúcar de cana e milho responsáveis por quase 60% de tudo o que vendemos.
O agro brasileiro tem a oferecer muito mais. O Brasil possui uma produção agropecuária altamente diversificada e tem condições de ampliar a sua participação no Oriente Médio.
Acreditando nesse potencial, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) escolheu Dubai para sediar o seu terceiro escritório internacional – em 2021, foram inauguradas as representações em Xangai e Cingapura.
Com essa iniciativa, a Confederação pretende promover e facilitar o acesso dos pequenos e médios empresários rurais à região, fornecendo inteligência local e suporte customizado.
Contar com uma rede de apoio local acelera a entrada e a consolidação no comércio exterior.
O universo de empresas brasileiras que exporta é muito baixo. Uma das causas é o tamanho do nosso mercado doméstico. Participar do comércio exterior é um processo custoso e demorado. Deve ser encarado como um investimento de longo prazo. E como tal, quanto mais apoio e informações qualificadas o exportador tiver, mais assertiva será sua investida.
Neste artigo, por exemplo, o termo “Oriente Médio” foi utilizado como se fosse um único mercado, mas na verdade, estamos tratando de 14 países: Arábia Saudita, Bahrein, Catar, Kuwait, Emirados Árabes Unidos, Iêmen, Irã, Iraque, Israel, Jordânia, Líbano, Omã, Palestina e Síria.
É imprescindível delimitar o mercado alvo e elaborar uma estratégia de internacionalização específica.
Oportunidades existem em todos os países para as empresas que conseguem se firmar como um fornecedor confiável e sejam capazes de se adequar às exigências locais.
Sueme Mori é Coordenadora de Inteligência Comercial da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA)
*Artigo originalmente publicado na Broadcast