‘Apanhei na rua por causa da Dóris’, assume Regiane Alves
NO AR NA REPRISE DE ‘Mulheres Apaixonadas’ na pele da malvada Dóris, Regiane Alves relembra a forma como foi tratada pelos telespectadores da trama de Manoel Carlos por conta de sua personagem: “Eu estava em um elevador e, de uma forma bem inesperada, uma senhora me atacou com o jornal dela (risos)”. A atriz ainda fala sobre sua vida pessoal e comenta sua relação com a ex-sogra Regina Duarte, que foi secretária de Cultura do governo Bolsonaro durante 20 dias.
Estamos vendo a reprise de ‘Mulheres Apaixonadas’ e cenas icônicas de Dóris. Em sua opinião, o que a levou a entrar na galeria das personagens inesquecíveis?
Dóris é uma personagem que surpreendia o público. E vejo que segue surpreendendo. As atitudes, as coisas que ela falava… Você pensa: “Não, ela não disse isso! Não, ela não fez isso!”. E isso era quase como uma catarse, aquelas coisas que algumas pessoas até sentem, em algumas situações, mas está tão velado, tão escondido. E eram os maiores absurdos possíveis. E Dóris não só fazia, mas via aquilo como algo natural. Ela via a falta de educação, a falta de empatia e a arrogância dela como se fosse sinceridade. E não, não era sinceridade. Acho que essa falta de noção dela fez com que as pessoas quisessem ver mais e mais… Queriam ver se existia algum limite, sabe? Para mim, Dóris só amava a si própria. E nada em volta dela tinha importância. Além disso, a construção da Dóris trazia uma coisa diferente, fora do padrão que a gente vê na dramaturgia, que é uma neta maltratando os avós. Isso também mexeu muito com o imaginário do público.
Já aconteceu de você ter sido chamada para uma produção, não aceitou e se arrependeu?
Não, nunca aconteceu! São 20 anos de Globo e os trabalhos sempre surgiram na minha vida de forma espontânea. Eu disse apenas dois “nãos”. Um deles foi por um motivo lindo, pois eu recebi o convite para fazer uma personagem bem no dia em que soube que estava grávida do meu primeiro filho. E, numa outra vez, acabei não aceitando uma personagem numa trama das seis porque eu estava vindo de duas novas. Precisava de um respiro. Sou muito feliz com as minhas escolhas profissionais e a emissora sempre me trouxe projetos muito interessantes.
Além da Dóris, você fez outra vilã, a Clara (‘Laços de Família’), mas fez mocinhas também como Belinha (Remake de ‘Cabocla’). Sem ser essas três personagens, existem outras que você curtiu muito em fazer?
Super! Tem sim! Eu amei fazer, por exemplo, a Marli de ‘Cidades Proibidas’. Foi um trabalho especial e que me instigou muito, assim como a Joana, de ‘Beleza Pura’. Tive muitas personagens legais (risos). Trabalhos que eu amei fazer. Isso é um bom sinal, né?! Fora da TV, destaco a Joanna de Angelis no cinema e a Renata de ‘Isolados’.
Era bom vencer concursos de beleza? Chegou a ganhar dinheiro?
O meu início na carreira artística foi em um concurso de beleza. Um concurso pequeno, desses de bairro. Ele se chamava ‘Garota Primavera’. Fiquei em segundo lugar, mas ali foi o início de tudo. Depois disso acabei procurando uma agência de modelo e modelei em São Paulo dos 13 aos 17 anos. Fiz várias campanhas, fiz a primeira capa da ‘Atrevida’ e fotografei para revistas como ‘Capricho’. Depois então fui para a Oficina de Atores da Globo e comecei a me dedicar à carreira de atriz.
Li que você gostava de moda e até pensou em seguir a carreira e entrou na faculdade de Comunicação Social. O que te fez seguir como atriz?
Eu sempre gostei de moda e como trabalhava como modelo acabei me aproximando muito deste universo. Fazia parte do meu cotidiano. Além disso, o meu pai conversava comigo sobre a importância de cursar uma faculdade e ele falava muito da EAD/USP. No fundo, acho que ele queria que eu estivesse na universidade. Eu sabia que o meu ofício era ser atriz, era a minha opção de vida. Mas essa é uma carreira muito instável, então optei por cursar Comunicação Social. Trabalhar como atriz era uma missão. Tanto que nos encontramos, eu e a minha carreira, e sou muito feliz por conseguir sobreviver desta profissão que eu tanto amo. A moda me levou para um lugar onde pude ter mais expressão enquanto artista. Mas como atriz, eu queria uma carreira mais longa do que como modelo – até porque não sou super alta (risos).
O que não tem perdão?
O preconceito é algo, para mim, que não tem perdão. Pessoas intolerantes por causa do amor que o outro sente e/ou por causa da cor da pele de alguém. Não tem perdão. Em especial, quando esse sentimento resulta em maltrato das pessoas. Ver uma pessoa se desfazendo de outra, seja qual for o motivo, é insuportável para mim. É impossível para mim tolerar ver alguém sendo destratado, desrespeitado.
Dizem que quando a gente nasce, a gente vai entrando na fila das características. Eu passei direto da fila da paciência. E você? Qual foi a característica que voltaria para pegar e outra que devolveria?
Pegaria mais paciência, com certeza (risos). Paciência nunca é demais (mais risos). Devolveria o meu senso de organização, que, às vezes, me cansa. Queria ser um pouco menos organizada. Dar aquela pirada com as coisas, sabe?! E não me importar tanto com a perfeição.
A gente percebia que você curtia participar da ‘Dança dos Famosos’. A dança continuou na sua vida?
Eu amei participar do ‘Dança’. Mesmo! Eu me surpreendi muito, inclusive. Não pensava que iria curtir tanto a experiência. Descobri partes no meu corpo que eu nem sabia que existiam. Senti dor em cada lugar (risos). Os ensaios exigiam demais. Ficava exausta, mas, ao mesmo tempo, era muito bom. Gostaria de ter a dança mais firme na minha vida, mas não consegui. E logo no início do ano veio a pandemia, então, todos os planos foram por água
Você é uma atriz que dificilmente está envolvida em polêmica, não é vista em movimentos e campanhas. Por que?
Eu gosto de me expressar com o meu trabalho. Eu levo as minhas questões para a arte, para o palco. É lá que eu me engajo, que eu coloco as minhas reflexões, que eu cumpro o meu papel como artista. Não sinto a necessidade de fazer isso nas redes sociais. Prefiro seguir fazendo meu papel através do meu ofício. Quando venho à público, o meu trabalho e a minha arte estão à frente da minha vida pessoal, da minha família. A arte, o trabalho, as personagens podem responder muitas questões. E eu me sinto mais coerente com os meus princípios quando estou agindo desta maneira. Acho que isso é fruto de um pensamento que segue comigo desde sempre. Eu acredito no talento. Quando a pessoa constrói uma carreira sólida, com muito trabalho, estudo e dedicação, isso se torna maior do que qualquer outro assunto relacionado à vida pessoal. O legado das pessoas, quando consistente, fica, perdura. As polêmicas passam. Eu defendo causas que têm uma verdadeira relação com as coisas que acredito. Não saio postando milhares de pedidos de ajuda e alertas de campanhas que eu nem conheço. Gosto de ser essa pessoa de verdade que muita gente conhece fora dos sets de gravação. No início do período de isolamento social, tentei ao máximo ampliar a minha voz em prol das pessoas mais prejudicadas com essa pandemia. Recentemente em envolvi em uma grande campanha para ajudar a grave situação do nosso Pantanal.
Algumas atrizes de vez em quando falam ter sofrido por ter que beijar ator com mau hálito, não ter tido empatia com algum colega ou ter brigado com o diretor. Já passou por alguma dessa situação?
Olha, já aconteceu de não ter tanta afinidade com um colega de cena, mas nada grave. Poderia ter tido uma troca melhor, mas não rolou. E ok. Faz parte do processo e da vida. Isso de mau hálito, não! Sorte a minha (risos). Já aconteceu de eu estar no meio da rivalidade de outras atrizes, sabe?! Tipo, na sala de maquiagem, e uma mandar indireta para outra. E outra para uma. E eu no meio (gargalhadas). Aliás, eu sou rainha dessas situações em que gostaria de cavar um buraco no chão e colocar a cabeça (gargalhadas).
Parece que você tem uma relação muito boa com a sua ex-sogra Regina Duarte. Como você reagiu e reage ver as críticas depois da passagem relâmpago na Secretaria de Cultura?
É verdade sim. Eu tenho uma relação muito boa com a Regina. Há um enorme respeito uma pela outra. E não poderia ser diferente. Ela merece o meu respeito porque é a avó dos meus filhos. E eu sou a mãe dos netos dela. Essa relação, essa nossa ligação familiar, vai sempre a prioridade em nossas vidas, independente de cargos que já tenha assumido ou que venha a ocupar.
Regiane Alves é uma mulher…
Que tem orgulho de ser quem é. Que ama ser independente e livre. Que ama os filhos, ama os amigos e ama a vida!
Dois sonhos: aquele que ainda pretende realizar e aquele da infância e que ficou lá atrás?
Um deles é uma viagem só minha. Eu sonho conhecer o Japão. Na época em que trabalhava como modelo, nunca consegui ir. Eu pretendo realizar esse desejo antes dos 50 anos. E o outro é viajar pela Europa com os meus filhos. Viajar é algo que prezo muito. Faz um bem enorme, a gente conhece pessoas e culturas diferentes. Adquire conhecimento, experiências, vivências. Uma viagem marca a nossa vida. Imagina só eu poder dar uma aula de história e geografia para os meus filhos in loco. Ver arte de perto…
Como mãe, o que você faz que nunca imaginou ou criticou e agora está pagando a língua?
Enquanto a gente está na expectativa, temos uma vida. Nada como a maternidade real para trazer a gente para colocar os pés no chão. Depois que ela acontece, muita coisa muda. No meu caso, eu idealizava questões como o parto. Para mim tinha quer parto normal. Tentei e não consegui. Quando isso aconteceu, caiu uma ficha e vi que cada mulher reage de um jeito, não tem regra. A fase da amamentação também me deu uma boa situada, porque para algumas mulheres é muito difícil… Atualmente estou na fase de buscar o equilíbrio com toda essa tecnologia que está ao nosso redor. É muito comum ouvir: “não deixarei meu filho fazer isso ou aquilo”. Mas a gente se vê tento que aprender na prática. E esse aprendizado é com eles, com nossos filhos. Eu aprendo demais com os meus, todos os dias.
Já fez alguma loucura por amor? Faria?
Já!!! E eu acho que nunca contei sobre isso em entrevistas. Conheci uma pessoa e de um beijo nele. Literalmente um beijo. Não sei de onde tirei coragem, mas mandei uma mensagem com uma proposta “quase” indecente (risos)… Perguntei se ele topava ir para Paris encontrar comigo, porque eu já estava lá. Ele topou! Chegou no dia seguinte! E assim ficamos juntos em um relacionamento que durou cinco anos.
É verdade que você quase apanhou na rua por causa da Dóris. Acha que, hoje, as pessoas ainda confundem personagem com o ator?
Quase não, eu apanhei na rua por causa da Dóris. Eu estava em um elevador e, de uma forma bem inesperada, uma senhora me atacou com o jornal dela (risos). Eu fiquei totalmente sem reação. Acho que não estava entendendo o que estava acontecendo. Dóris mexeu muito com o ânimo das pessoas. Ela tirou muita gente do sério. Mas isso foi há 17 anos. Hoje não é mais assim. Hoje as pessoas continuam nos abordando, no meu caso sempre de um jeito muito carinhoso, mas elas sabem separar a personagem da vida real. A rede social tem um peso grande nisso. A gente abre uma parte das nossas vidas ali, mostramos um pouco – ou em alguns casos, muito – do que somos quando não estamos interpretando uma personagem. Acho que se a Dóris estivesse sendo feita nos dias de hoje, o público me abordaria para falar dela, uma terceira pessoa.
Está cada vez mais complicado ser um profissional liberal em um país com a economia instável como a nossa. As grandes emissoras querem só contratos por obras e nem sempre tem produções para todo. Você tem outro investimento ou um plano B?
Eu sou empreendedora. Sempre tive esse espírito de empreender. Tenho dois restaurantes no Rio de Janeiro, ‘Massa’ e ‘Ella Pizzaria’, e amo esse lado de negócios. Mas não vejo como um plano B, porque é algo que eu já administro na minha vida. É complementar. Não me vejo sendo feliz sem atuar. Sou atriz e é na arte que me realizo profissionalmente. E sei que eu vou seguir atuando até morrer. Esse é o meu desejo.