Chloé Zhao é a primeira mulher não branca a vencer o Oscar de direção
Num Oscar 2021 que tem a diversidade como um dos temas principais, Chloé Zhao fez história: ela é a primeira mulher não branca a vencer a estatueta de direção, em mais de 90 anos de cerimônia. A diretora de “Nomadland” é também apenas a segunda diretora mulher a vencer a categoria.
Nascida e criada em Pequim, Zhao ainda tinha a oportunidade de alcançar outra marca histórica, se vencesse os quatro Oscars aos quais foi indicada, mas ela acabou superada por “Meu pai” em roteiro adaptado. A última vez que alguém ganhou quatro Oscars na mesma noite foi Walt Disney, em 1954.
Nascida e criada em Pequim
Apesar de estar concorrendo ao Oscar com um filme bem americano — “Nomadland” faz um retrato de cidadãos dos EUA empobrecidos pela crise econômica que viajam pelo Oeste do país em trailers vivendo de empregos temporários — Zhao nasceu e cresceu em Pequim, na China.
Nascida Zhao Ting, ela era uma criança rebelde enquanto crescia. Nos anos 90, se apaixonou por mangás, Michael Jackson e os filmes de Wong Kar-wai. Aprendeu inglês na Inglaterra, onde estudou em um internato e, em 2000, se mudou para Los Angeles para terminar o ensino médio. Foi neste ano que “cresceu”, disse a diretora à New York Magazine.
Cientista política, bartender e cineasta
Para filtrar a visão romântica que tinha dos EUA através da centena de filmes que tinha visto, decidiu estudar ciências políticas após o ensino médio. Quatro anos foram suficientes para perder o interesse na política e descobrir o interesse nas pessoas. Ela queria contar histórias, mas não era ótima em pintura, fotografia, música ou qualquer outro de seus interesses.
Depois de um período como bartender e freelancer, finalmente se encontrou estudando arte e fazendo filmes. Em 2010, se matriculou na escola de cinema da Universidade de Nova York, onde teve aulas com Spike Lee e começou a filmar curtas. “Você não precisa ser um mestre em nada, apenas um pau para toda obra para ser um diretor”, diz ela. “Eu contrato pessoas que são realmente boas em seu ofício e as coloco juntas.”
Parceria na vida e nos filmes
Foi na Universidade de Nova York que ela conheceu o inglês Joshua James Richards, que viria a se tornar seu parceiro de vida e trabalho. “A maioria das pessoas com quem eu estava passando meu tempo ficavam sentadas conversando sobre seus projetos. Chloé estava fazendo eles, tirando do papel. E então eu pulei naquele trem”, disse em entrevista à New York Magazine.
Hoje, o casal divide, além do trabalho — ele é o diretor de fotografia nos filmes de Zhao — dois cachorros e algumas galinhas em uma casa com vista para um campo de laranjeiras em Ojai, uma cidade nas montanhas próxima a Los Angeles.
Reconhecimento precoce
Já no seu curta de estreia, em 2010, foi premiada. Em 2015 fez seu primeiro longa, Songs My Brother Taught Me (“Canções Que Meu Irmão Me Ensinou”, em tradução livre), drama sobre a vida moderna em uma reserva indígena dos EUA.
Mas seu trabalho como cineasta chamou a atenção do mundo em 2017, com o segundo longa, Domando o Destino (The Rider, no título original), filme sobre a vida de Brady Jandreau, uma estrela em ascenção do circuito de rodeio, que vê sua carreira ser encerrada após um trágico acidente.
Você viu?
Ali, já estavam presentes os traços característicos de seus filmes: histórias reflexivas em ritmo mais lento, com mais baixo orçamento e não-atores.
Novo filme da Marvel
Do micro para o gigante, Zhao é o nome por trás da direção do esperado filme da Marvel, “Os Eternos”, que tem no elenco nomes como Salma Hayek e Angelina Jolie. Será o primeiro blockbuster da diretora, que até então fez sua carreira em filmes independentes e de baixo orçamento. O filme foi adiado por causa da pandemia, mas Zhao segue trabalhando na pós-produção.
O arco de sua carreira, de um drama com micro orçamento ambientado em uma reserva a uma saga sobre alienígenas imortais com orçamento milionário, pode parecer confuso, mas é assim que o sucesso se parece para uma diretora moderna em Hollywood.
Prêmios e mais prêmios
Desde que venceu o Leão de Ouro em Veneza, em setembro de 2020, a cineasta não parou de arrebatar troféus. “Nomadland” já acumula quase 30 prêmios, nove de melhor direção para Zhao, que quebrou o jejum em diversas premiações que não premiavam mulheres diretoras há anos.
Em fevereiro, ela se tornou a segunda mulher e a primeira de origem asiática a levar para casa o Globo de Ouro de melhor direção. Fazia cinco anos que uma mulher não disputava a categoria e 37 que uma diretora não vencia — a última e única até então era Barbra Streisand, por “Yentl”, em 1984.
No início de abril, Zhao se tornou a segunda mulher da história a vencer o prêmio de melhor diretora do Sindicato de Diretores da América (DGA, da sigla em inglês). Também neste mês, levou para casa o prêmio de melhor filme e melhor direção do BAFTA, o oscar britânico, confirmando seu favoritismo para este domingo.
Boicote na China
O sucesso de “Nomadlad” foi inicialmente aplaudido na China, onde Zhao nasceu, com a mídia local noticiando a “diretora chinesa”, descrevendo-a como “uma fonte de orgulho”. Mas poucos dias depois, postagens sobre o filme na Weibo, rede social chinesa, começaram a ser removidos.
O motivo seria uma entrevista de Zhao à revista “Filmmaker” em 2013, em que ela descreveu a China como “um lugar onde há mentiras em todos os lugares”. Em outro trecho da entrevista, que também circulou nas redes sociais, ela indica que “Estados Unidos agora é [o seu] país”.
No aplicativo da Weibo, as hashtags “Nomadland tem uma data de lançamento” e “No Land to Rely On” (o título chinês do filme) agora retornam a mensagem: “De acordo com as leis, regulamentos e políticas relevantes, a página não foi encontrada.”
A estreia de “Nomadland” na China estava oficialmente programada para 23 de abril, mas passada a data, o laçamento no filme por lá ainda é incerto.