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Como a adultização pode interferir no crescimento de uma criança

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Atriz portuguesa postou foto do filho de três anos dando beijo na boca de outra criança e acendeu debate sobre adultização e sexualização de crianças
Instagram/Reprodução

Atriz portuguesa postou foto do filho de três anos dando beijo na boca de outra criança e acendeu debate sobre adultização e sexualização de crianças

O termo “Criança não namora” apareceu nos assuntos mais comentados no Twitter na tarde da última quarta-feira (3) após a  atriz portuguesa Sofia Arruda postar uma foto do próprio filho, de três anos, trocando um beijo na boca com outra menina. A atriz, que expressou naturalidade com a foto, foi criticada porque estaria promovendo a adultização e sexualização precoce das crianças envolvidas no post.

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A adultização diz respeito à tentativa de acelerar, de alguma maneira, o desenvolvimento cognitivo e comportamental de uma criança. Nesses casos, se incentiva que a criança passe a realizar “coisas de adulto”, o que acaba encurtando a fase da inocência e pode até vulnerabilizar a criança em outros sentidos, como não conseguir identificar abuso sexual infantil , por exemplo.

A psicanalista Andréa Ladislau afirma que casos como o da atriz são comuns. “Esse tipo de atitude é tida como uma ‘brincadeira inocente’, mas nem sempre é tão inocente assim. Mesmo que seja um ato que a atriz considere bobagem ou brincadeira pode fomentar a adultização da criança”, afirma Ladislau.

A especialista afirma que a infância é marcada pelo período da vida em que a pessoa não compreende o mundo ao redor da mesma forma que os adultos. Isso porque um adulto e uma criança vivem fases cognitivas distintas. Ao tratar a criança como uma pessoa capaz de fazer os mesmos discernimentos que um adulto ou com capacidade de agir da mesma forma, promove-se uma aceleração desses estágios de desenvolvimento.

“O resultado de ações como essa, pode evidenciar a necessidade da criança em passar a imitar um comportamento que ela vê em casa ou na sociedade a sua volta, sem compreender o que aquele comportamento significa. O perigo ao incentivar essas atitudes é o encurtamento da infância e a sexualização precoce. Esse encurtamento acontece quando se leva ao universo infantil um conteúdo que pertence ao universo do adolescente e do adulto”, salienta Ladislau.

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Pilares como o erotismo, o sentimento amoroso, o desejo sexual e a sensualização, tão importantes para a vida adulta, são desenvolvidas por etapas conforme cada indivíduo amadurece. Ao atribuir à criança o ato de namorar, beijar ou acariciar da mesma forma que os adultos, os adultos passam a observar as crianças de maneira já erotizada. No entanto, a especialista aponta que, apesar de a sexualidade ser presente desde o nascimento, os pequenos não são capazes de compreendê-la totalmente na primeira fase da vida.

Ladislau aponta que o desejo das crianças vem da necessidade de contato humano. Empurrar essa interação para o campo amoroso ou sexual é colocá-las em uma situação em que não estão preparadas para estar. “Isso pode causar muita angústia e a sensação de estar perdida e confusa, sem compreender o que lhe é permitido ou não”, afirma a psicanalista.

A especialista aponta que essa atitude demonstra um descuido em preservar o emocional e o desenvolvimento cognitivo da criança, além de denotar uma postura imatura por parte do responsável. Ao contrário do amor romântico e do contato sexualizado, é necessário estimular outras fontes, como respeito, empatia, reciprocidade e pureza aos sentimentos (tanto da própria criança como alheios).

Ladislau afirma que preservar as crianças desses contatos precoces não quer dizer que não deve existir uma educação sexual em casa. Na verdade, ela considera esse um pilar muito importante para o crescimento saudável. No entanto, essa educação precisa ser feita com orientação, condução, diálogo e respeito, acompanhando o momento cognitivo.

“Os carinhos, afetos e até os romances, nascem de forma natural e devem acompanhar as etapas do crescimento infantil, de forma equilibrada e sem aceleração do processo”, enfatiza.

Abuso sexual infantil

Durante a repercussão da foto do filho da atriz, bem como da legenda em que ela normaliza o comportamento, os internautas apontaram que a adultização e sexualização de uma criança poderia vulnerabilizá-la aos abusos sexuais. Isso porque, incentivada ao comportamento sexualizado, ela não poderia identificar possíveis situações de perigo.

Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2022, organizado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), houve mais de 66 mil casos de estupro no Brasil em 2021, sendo que 61,3% das vítimas das violências tinham até 13 anos. Em quase 80% desses casos, o autor da violência sexual é um conhecido da vítima. Ou seja, em casos de adultização, a vítima pode estar vulnerável a abusos por parte de uma pessoa do círculo social próximo dela.

No entanto, Ladislau afirma que o papel da adultização e da sexualização precoce como facilitador de abusos sexuais depende de como a criança experimenta o núcleo social em que está, como “se ela é acolhida e ouvida de forma cuidadosa, se todas as dúvidas são atendidas e se ela sente segurança na proteção de seus acolhedores”, diz.

A psicanalista afirma que faz parte do papel da educação de responsáveis e educadores delimitar os comportamentos que são próprios ou não. “Deve-se explicar explicar que namoro e carícias explícitas, são coisas de adulto e que as crianças possuem amigos e colegas”.

Sem as indicações e o acolhimento familiar, a criança pode sentir a necessidade de buscar o carinho externamente, o que aumenta os riscos de abuso; e junto com ele, o risto da criança não saber identificar que está sofrendo um abuso. “Porque ela sempre irá oferecer, sem resistências, por falta de orientação e compreensão, o que ela tem de melhor: seu afeto, seu amor, seu carinho. Mas nem sempre é isso que terá de retorno do outro”, analisa Ladislau.

“Ou seja, a criança cresce sem conseguir ter noção e critérios de avaliação crítica adequada de determinadas situações da vida, já que tudo pode. Não podemos esquecer que, a criança aprende a partir da experimentação, da visualização constante e também da orientação de alguém. Por isso, devemos ter cuidado e responsabilidade no que espelhamos para elas”, complementa.

Tem idade certa para namorar?

Essa é uma pergunta sem resposta, explica Ladislau. Ela afirma que é preciso lembrar que o momento cognitivo da criança faz com que ela não entenda o que significa o ato de namorar; e, por isso, não devem receber esse estímulo.

“É importante que ela receba a orientação de que, certas coisas, só poderá fazer quando ‘crescer’. E esse crescer está intimamente ligado ao desenvolvimento cognitivo/comportamental, associado à compreensão e noção do senso de autoridade”.

O tempo em que esse “crescer” vai acontecer é extremamente subjetivo, pois depende do desenvolvimento mental, emocional e até físico de cada pessoa. Portanto, não há uma idade biológica estipulada.

“Só quando os níveis de maturidade estão elevados e esse jovem compreende seus limites, os limites do outro e a gerenciar com mais clareza seus sentimentos e emoções é que poderá estar em uma relação, onde também será responsável afetivamente pelos sentimentos de uma outra pessoa”, diz a psicanalista.

Ela afirma que, em famílias com uma boa relação e base de acolhimento, os responsáveis conseguem perceber quando esse momento de maturidade acontece. Portanto, é necessário respeitar essa etapa.

“Cada indivíduo é único e tem o seu próprio tempo. Os pais devem conhecer bem os seus filhos para que possam perceber a forma como eles lidam com as suas relações e com as suas emoções”.

Fonte: IG Mulher

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