Halloween: bruxas existem e elas não são más como te disseram
O dia 31 de outubro é lembrado como a data de celebração do Halloween, ou em português, Dia das Bruxas . Ao longo dos séculos essas mulheres foram vistas como dois extremos: senhoras, cheia de verrugas ou moças lindas e sensuais. Além disso, eram imaginadas e representadas como seres malignos, que lançam feitiços para evocar o mal e cozinhar criancinhas em caldeirões.
Mas a verdade, é que tudo isso não passa de mitos e bruxas reais (netas daquelas que não conseguiram queimar) estão aqui para desmenti-los e mostrar de uma vez por todas o que realmente é a bruxaria.
Bruxaria é feitiços malignos e sacrifício de criancinhas?
Helen M. Mello (20) se descobriu bruxa aos 13 anos. Ela também é taróloga há quatro. Apesar de nova, ela já é presente no meio há muito tempo e já começa a explicar sobre esse estilo de vida já na forma de escrever seu nome. “Tem que colocar o ‘M’ no meio porque a energia que ele passa no nome escrito dessa forma é diferente de só colocar Helen Mello, por exemplo”.
De acordo com a jovem, é exatamente disso que a bruxaria se trata: energia, espiritualidade, empoderamento e culto à natureza. Helen explica que a bruxaria é um estilo de vida baseado no ocultismo e na magia. “Nós cremos que podemos interferir no universo através da magia. A bruxaria é a união dessa magia com a espiritualidade”.
Além disso, ela pode ser considerada tanto como um movimento filosófico, quanto religioso. Dentro dela podem existir várias vertentes.
“É como se ela fosse uma árvore muito frondosa, de muitos galhos e cada um deles fosse uma vertente, ou seja, uma cultura, tradições”. A jovem explica que bruxas podem seguir várias religiões diferentes. A mais popular é a “Wicca”. Apesar disso, elas não precisam necessariamente seguir uma, já que acreditam que isso não é necessário se possuem fé.
“O estilo de vida é de liberdade religiosa, contato com a natureza, um poder que vem de dentro de você. Você possui uma livre escolha de deuses. Ela é muito diversa, com várias vetentes, mas liberdade e amor são os principais princípios”, explica a bruxa.
Feitiços, rituais e magia
“Magia é a nossa demonstração da fé”, conta Helen. Por muito tempo os feitiços e rituais das bruxas foram condenados, principalmente pela Igreja Católica em sua “caça às bruxas”. “Sempre foram atrelados a algo negativo e isso muito também porque somos mulheres”, relata Helen. “Isso vem desde a inquisição, que queria exterminar mulheres livres. Sim, nós somos bruxas, mas vocês não podem mais nos queimar”.
A bruxa explica que os feitiços, rituais e magia são feitos unicamente para atingir objetivos pessoais, de desejo, mas nunca para prejudicar alguém. “Não existe essa história de matar uma criança, bruxaria não é sobre isso. É usar a magia para se conectar com o universo, consigo mesma, é a busca pela mudança coletiva”, afirma Helen.
Ver essa foto no InstagramUma publicação compartilhada por Helen M. Mello (@mehelen.mello) em 28 de Out, 2020 às 11:22 PDT
A bruxa ainda conta que a magia está presente em qualquer religião ou cultura, só depende de como você olha para isso. Você pode usar de objetos de outras culturas e aquilo pode ser como um feitiço, por exemplo. Tudo é uma construção espiritual, como qualquer outra e não está atrelada a algo ruim.
Cada feitiço vai exigir um material que vibra uma determinada energia. Existem receitas prontas e também feitiços criados para um único fim. Por exemplo, no feitiço de adoçamento, como explica Helen, usa-se o mel para unir e harmonizar, a canela como um afrodisíaco, as rosas para trazer o elemento venusiano e por aí vai. Um banimento, por exemplo, usará outros elementos, como um banho de sal grosso, anis, defumaçao com eucalipto, entre outros.
Os elementos usados tem que condizer com o objetivo, então podem ser feitos numa fase da lua que seja favorável. Os feitiços com base na lua seguem o seu ciclo: abertura de caminhos na lua nova, prosperidade na crescente, poder na cheia e limpeza na minguante.
Abaixo, ela dá alguns exemplos de feitiços e afins que já realizou.
“Esse é um banho energizado para prosperidade, autoconfiança, energia e motivação”.
“Esse foi um feitiço de amor que deu super certo, ele serve para aproximar um casal que já está ‘paquerando’, dando mais energia e acelerando a ‘união'”.
“Esse foi um feitiço usado para unir um casal que estava brigando muito, o resultado foi que ambos ficaram mais confiantes e calmos, diminuindo o ciúme e o estresse cotidiano”.
“Esse aqui foi pra aumentar a harmonia e sexualidade entre um casal que estava junto a muito tempo e as coisas estavam ‘frias’. O resultado foi tão potente que tiveram um filho logo depois”.
Bruxaria como religião
Apesar de possuir várias vertentes, a religião oficial e mais conhecida da bruxaria é conhecida como “Wicca”. Bruna Cobellas (29), é sacerdotiza da religião e dona do canal do Youtube “Aliança Wicca”, além de possuir um grupo no Facebook de mesmo nome. Ela explica que seguir essa religião significa adorar a natureza, tratar o sol (representante dos seres vivos) como seu Deus e a lua (representante da natureza) como sua Deusa.
“As pessoas acreditam que nós adoramos o demônio, mas a gente nem acredita nele, sabe?”, conta Bruna. “Não existem pactos, ou coisas do tipo, isso tudo faz parte do que a mídia inventa, falando que somos demoníacas”.
De acordo com ela, é apenas um culto e honraria da natureza e preocupação em em se equilibrar com seu corpo, energia e espiritualidade, meditação, cristais, pedras que vieram da natreza, banhos e chás naturais. “É equilíbrio para o ambiente e para dentro de nós”.
Bruna ainda explica sobre alguns objetos mal vistos. O pentagrama, visto por muitos como um símbolo ruim, é na verdade um amuleto de proteção, que simboliza todos os elementos: fogo, ar, água e energia vital. Além disso, ela explica que os famosos caldeirões existem, mas não são feitos para cozinhar criancinhas como muito se pensa.
“Usamos para queimar ervas, pedidos, desejos, poções de proteção e prosperidade. É chamado por nós de ‘útero da deusa’ e também não carrega nada de ruim”, afirma.
Bruxaria como uma terapia de autoconhecimento
Helen Mello faz mentorias terapêuticas para mulheres que querem se envolver com a bruxaria, onde trabalha a mediunidade e o autoconhecimento, “um mergulho em si”, diz. Catiúscia Vargas, é professora de Artes e aderiu à terapia no início da pandemia do novo coronavírus.
“Me deparei com muito tempo em casa e consequentemente, muito tempo para pensar. Fui percebendo com o passar dos dias que algo faltava”, comenta. ” Um dia em uma rede social vi uma postagem da Helen sobre um grupo no Whatsapp sobre bruxaria, e pensei…porque não? Sempre gostei do assunto, mas nunca tinha me aprofundando”, conta.
Ela continua:” Entrei nesse grupo e um novo universo surgiu. Comecei a pesquisar sobre assuntos que nunca tinha ouvido falar, como sagrado feminino, conexão com a Deusa. A cada nova descoberta, mais portas se abriam, mais assuntos surgiam, mais interessada eu ficava”.
Ela começou a fazer a terapia com a Helen e diz ter descobertos nuances suas que encontravam-se ate então “escondidas e sufocadas”. “Novas facetas minhas foram desabrochando. As mudanças foram enormes e surpreendentes. Aprendi a meditar para encontrar as respostas, pois elas já estavam dentro de mim, só precisava aprender a ouvir. Descobri um grande interesse, além de surpreendente facilidade, na leitura de cartas do Tarô e no Baralho Cigano”, conta.
Ela disse que começou a sentir mais criatividade em seu trabalho e investir mais nele. Iniciou um curso de terapia holística e também quer trabalhar com isso, ajudando mulheres a se reencontrar, como ela se reencontrou. “Ainda tenho uma longa jornada de aprendizado na bruxaria e na espiritualidade, porém não estou mais perdida, estou no caminho e agora e só seguir”, finaliza.
Qualquer uma pode ser bruxa?
Gabriel Dacc (30) é sacerdote e escritor e escreveu o livro “Teoria e Base da Magia”. Ele explica mais sobre os princípios básicos da bruxaria. “É comum acharmos pessoas que dizem ter a necessidade de ter uma linhagem de sangue e outras ideias hollywoodianas, mas a grande verdade é que qualquer pessoa pode ser bruxo ou bruxa”.
De acordo com ele, o que define a filosofia e a religião é a capacidade de entender os fenômenos da magia (energia, espiritualidade, oráculos, mediunidade e etc) a partir de muito estudo teórico e prática responsável.
“Ser bruxa não é pegar um caldeirão e colocar fogo dando risada. É entender a quando e por que colocar fogo no caldeirão. Qual erva usar para uma situação específica, qual força da natureza evocar para auxiliar em um momento de necessidade e quais deuses tem as qualidades que possam ser equivalentes as nossas”, explica.
Como começar na bruxaria
O ideal é a pessoa interessada a ser um néofito (iniciante na bruxaria) estudar antes as vertentes, para saber com qual ela tem mais afinidade, aconselha Gabriel. A bruxaria não é composta apenas por uma única vertente, ela é uma rede de filosofias que são divididas em tradicionais ancestrais e neo-pagãs.
Quando o neófito escolhe sua vertente se baseando em valores morais, afinidade com os cultos e identificação com sua personalidade, ele passa a adentrar uma religião ou uma filosofia e deve assim respeitar os dogmas dessa vertente que escolheu.
“O que eu sempre digo para aqueles que não tem conhecimento nenhum é começar por uma religião de maior acessibilidade, uma religião que tenha bastante material disponível e opiniões. Por isso encontramos, hoje em dia, tão facilmente umbandistas que abraçam a bruxaria. Pois é uma religião difundida no Brasil que nos permite ter contato com um lado mais místico, espiritualizado e até mesmo semelhante com a bruxaria no tratamento da natureza”.
Onde buscar?
Gabriel explica que é importante se atentar que também existe charlatanismo na bruxaria. Ou seja, deve-se tomar cuidado com os lugares onde se busca conhecimento. “Jamais aceite fazer coisas que moralmente você não faria, nem abuso algum”, aconselha Gabriel.