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Lei Maria da Penha faz 15 anos; entenda como funciona e sua importância

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Lei Maria da Penha faz 15 anos; entenda como funciona e sua importância


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Maria da Penha Maia Fernandes, que deu nome à Lei Maria da Penha, principal legislação contra violência de gênero no Brasil
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Maria da Penha Maia Fernandes, que deu nome à Lei Maria da Penha, principal legislação contra violência de gênero no Brasil




Neste sábado (3), a Lei nº11.340, mais conhecida como Lei Maria da Penha, completa 15 anos . Sancionada em 2006, a lei foi a primeira voltada exclusivamente à violência de gênero. Primeiramente direcionada à violência doméstica , a lei Maria da Penha tem se modificado ao longo dos anos para enquadrar com mais precisão outros tipos de crimes cometidos contra mulheres.

Conforme explica Marina Ganzarolli, fundadora do Me Too Brasil , afirma que o crime pode ocorrer também em espaços públicos. “A lei também não abarca apenas relações sexuais e afetivas, mas todo e qualquer tipo de relação doméstica e familiar, desde marido até pai”, explica.


De lá para cá, a lei vem se adaptando às demandas das mulheres e vêm se qualificando para atender além da violência física. Assim, também são consideradas violência psicológica, sexual, patrimonial ou moral que tenham sido cometidas com a motivação de gênero (ou seja, baseado no fato de que a vítima é uma mulher).

“Quando falamos em violência de gênero, estamos abordando qualquer ação ou omissão que cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual, psicológico, dano moral ou patrimonial”, explica Ana Paula Kosak, advogada especialista em direito penal e criminologia. O crime pode ser cometido parceiros, independente do sexo. Além disso, a lei vale para todas as mulheres, incluindo as mulheres trans.

Sancionada durante o Governo Lula, a lei foi nomeada em homenagem à farmacêutica bioquímica Maria da Penha Maia Fernandes, que sofreu diversas formas de violência doméstica, incluindo uma tentativa de feminicídio em 1985 que a deixou paraplégica.

A legislação é resultado de um debate amplo realizado por um consórcio que reunia organizações civis e governamentais, especialistas e ativistas em busca de uma solução para o enfrentamento da violência doméstica. A ação ocorreu após o Brasil ser denunciado pela Comissão Internacional de Direitos Humanos (CIDH/OEA) entre 1998 e 2001 por omissão aos casos.

O resultado da lei nos dias de hoje é uma diminuição de 10% nos casos de violência de gênero e uma rede ampla de apoio e conscientização sobre violência contra a mulher. A Lei Maria da Penha também se tornou referência internacional e é considerada pela Organização das Nações Unidas (ONU) a terceira melhor lei de enfrentamento à violência doméstica no mundo.

Para Ganzarolli, a lei é um marco na proteção integral, é um marco na legislação de proteção integral e enfrentamento da violência doméstica intrafamiliar. “Ela é uma lei completa, integral e interseccional”, afirma.

“A Lei Maria da Penha foi um dos maiores avanços para a afirmação dos direitos das mulheres no Brasil. Ela evidencia que o problema causado pela violência de gênero não carece de uma lei com natureza penal, mas a importância de fornecer proteção integral e multidisciplinar no plano das políticas públicas”, explica Kosak.

Abordagem mais ampla da violência de gênero

Além do reconhecimento do problema em si, Ganzarolli afirma que a criação da lei também reconhece a violência de gênero como de interesse social e público. As medidas buscam aprofundar nas características específicas deste tipo de crime.

“É um problema de saúde pública que requer um tratamento específico. Ela é diferente da violência cometida na via pública, como um furto, por exemplo. Esta violência é fruto da desigualdade de poder entre homens e mulheres que existe na nossa sociedade, em todas as esferas das nossas vidas”, diz.

As especificidades das violências de gênero dizem respeito a questões que vão além da violência ou da penalização do agressor, mas também aborda assistência social, pensão alimentícia,  medidas protetivas e amparo psicológico à vítima. Além disso, ela também tem viés educativo e de prevenção. Por isso, para que a seja eficiente, a lei deve ser aplicada de forma integral.

“Somente a prisão do agressor não resolve. A lei é inteligente e inovadora porque afirma que devem ser criados juizados híbridos para que o problema seja tratado de forma holística, e não nas caixinhas do direito”, diz Ganzarolli. Mulheres que estiverem sofrendo situações de violência podem contar com apoios como medidas protetivas de urgência para impedir que as violências continuem e que a vítima tenha contato físico com o agressor.

“As medidas protetivas nada mais são do que determinações judiciais para que o agressor seja afastado do lar ou do local de convivência com a vítima. Além disso, ele é proibido de se aproximar da vítima ou familiares e tem a visitação aos filhos suspensa, entre outras medidas”, explica Kosak. A advogada explica que fica a critério do juiz encaminhar a vítima para programas oficiais de proteção e atendimento que dispõe de atendimento psicossocial, de saúde e jurídica.

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A medida protetiva foi concedida à dona de casa Virgínia*, 35, e a denúncia fez com que o agressor ficasse recluso por 7 meses. “Ele já tentou se aproximar como se nada tivesse acontecido dando como desculpa que queria ver as crianças. Nem as crianças querem ver ele”, diz. Graças às medidas instauradas, Virgínia consegue manter seus filhos e ela mesma longe do ex-marido.

Aperfeiçoamento e fiscalização

Ao longo desses 15 anos, a Lei Maria da Penha passou por diversas alterações e recebeu inserções para aprimorar os serviços. A primeira de todas, complementa Ganzarolli, foi tornar crime o descumprimento da medida protetiva. Ela explica que esse tipo de crime já existia e se enquadrava em descumprimento de ordem judicial. No entanto, o “novo” delito ajudava a otimizar o direcionamento com base na violência de gênero.

Na visão de Kosak, a lei passou por mudanças significativas, principalmente, nos últimos quatro anos. A mais importante delas, em sua visão, é a inserção de artigos por meio da Lei nº 13.505/2017. “Essa lei incluiu uma redação para afirmar o direito da mulher em situação de violência doméstica e familiar de ser atendida por equipe policial e pericial especializada e preferencialmente por servidoras mulheres”, diz.

A advogada acrescenta que essa inserção ressalta a necessidade de proteção da integridade física, emocional e psíquica da vítima que está realizando a denúncia. Além disso, a lei de 2017 reforça a importância da não revitimização da mulher na delegacia, proibindo questionamentos muito invasivos ou que atribuam culpa à vítima.

A advogada também cita as seguintes mudanças:

  • Lei nº 13.641/2018: descumprimento de medidas protetivas de urgência, que pode levar de três meses a dois anos de prisão;
  • nº 13.880/2019: torna obrigatório que agentes policiais verifiquem se o agressor possui armas de fogo ao registrar a ocorrência. Também torna possível a apreensão das armas;
  • Lei nº 13.827/2019: torna possível o afastamento imediato do agressor da residência em que mora a vítima por delegados e policiais em municípios sem acesso a juiz (chamados de comarcas), caso haja alto risco à vida e integridade física da vítima;
  • Lei nº 13.894/2019: facilita dissolução de união estável e divórcio pelo Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, facilitando acesso a serviços jurídicos;
  • Lei nº 13.984/2020: torna obrigatório que o agressor compareça a programas de reeducação e a realização de acompanhamento psicossocial.

“Esta última também pode ser considerada uma alteração importante, pois busca o atendimento e conscientização do autor das agressões, seguindo a linha de prevenção da violência, buscada pela Lei Maria da Penha desde sua origem”, continua a especialista.

A sanção e aplicação da lei também abriu espaço para o surgimento de outras leis relacionadas à violência de gênero. “Um marco importante foi a  Lei da Importunação Sexual [Lei nº 13.718/2018], que ficou conhecida principalmente após situações de ejaculação em ônibus serem noticiados”, diz. A importunação sexual também torna crime assédio verbal e outros tipos de abusos sexuais.

Outros exemplos são a  proibição do stealthing (quando o parceiro retira a camisinha no ato sexual sem consentimento) pelo artigo 215; a Lei do Feminicídio (13.104/2015) e, mais recentemente, a a aprovação do Senado de incluir violência psicológica contra a mulher no Código Penal.

Com o aumento da conscientização, cresce ainda o número de organizações e ações na sociedade para proteger e amparar vítimas de violência doméstica. Um exemplo é o Instituto Maria da Penha (IMP), fundado em Fortaleza em 2009, que monitora a aplicação e desenvolvimento da lei.

As ONGs Mapa do Acolhimento e o próprio Me Too Brasil, fundado por Ganzarolli, também nascem com o intuito de amparar vítimas e conectá-las a profissionais como advogadas e psicólogas. Além de representação gratuita, é possível conseguir atendimento psicossocial para auxiliar a mulher a retomar a vida após as agressões.

Kosak cita a ação “Sinal Vermelho contra Violência Doméstica”, realizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em parceria com a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB). Criada nos períodos mais restritos de isolamento social da pandemia, em 2020. A orientação é que as vítimas vão até a farmácia ou a agentes policiais com um “X” vermelho pintado na mão, sinalizando que precisam de ajuda.

Melhorias necessárias

Tanto Kosak como Ganzarolli concordam que a estrutura atual da Lei Maria da Penha no papel é muito completa. No entanto, ambas afirmam que existem falhas no momento da aplicação, como a falta de capacitação e especialização de profissionais, pouca efetivação diária das políticas públicas instauradas e pouco investimento de estrutura.

“O aperfeiçoamento que precisa ser feito é o da própria rede de atendimento à mulher. Ainda hoje, várias comarcas não possuem rede especializada e multidisciplinar para atendimento às mulheres em situação de violência”, diz Kosak. Ela acrescenta que isso acontece por falta de especialização e de organização da rede, que inclui juízes, promotores, policiais, psicólogos, assistentes sociais.

Um dos exemplos de falta de investimento está na Casa da Mulher Brasileira, criada em 2013, durante o governo Dilma Rousseff. A advogada cita o programa como um exemplo positivo implementado em poucas cidades. “O projeto concentra no mesmo local o serviço de acolhimento, apoio psicossocial e também jurídico”, diz.

Em 2019, a ministra Damares Alves, à frente do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos (MMFDH) afirmou que a manutenção do programa era “impossível”. A pasta dispunha, na época, de um orçamento federal de R$70 milhões. Em outra ocasião, no mesmo ano, Damares afirmou que manteria a Casa da Mulher Brasileira em formato menor, com verba de R$13,6 milhões. No entanto, o investimento parou.

O que fazer em casos de violência na delegacia?

Em muitos casos de falta de especialização por parte dos agentes policiais, as vítimas de violência doméstica acabam sofrendo outros tipos de violência por parte de agentes policiais. Quando Jéssica*, 18, fez a denúncia, ela foi hostilizada por policiais. “Quando chegaram, falaram que se eu não quisesse apanhar era para arrumar alguém que não me batesse”, diz. Ela também demorou para ser amparada pela assistência social. . No caso de Marta*, 47, a denúncia não foi para frente porque o agressor e o advogado dele eram conhecidos na cidade. Mesmo em uma Delegacia da Mulher, ela foi atendida apenas por homens. “Além de tudo, fui tratada com desdém”. Algo similar aconteceu com Vânia*, 45. “Dei parte várias até em delegacia de outra cidade e rã em outra cidade. Ele ganhava carona para casa dos policiais”.

Apesar do texto da Lei Maria da Penha dar preferência a atendentes mulheres, Kosak explica que isso não é uma obrigação. Além disso, pode haver falta de recursos humanos em algumas regiões, o que impossibilita que o atendimento seja feito por mulheres. No entanto, ela diz que o objetivo é incentivar que mais agentes sejam especializadas e o recebimento de denúncias seja feito apenas por pessoas do gênero feminino.

A advogada afirma que, em casos de abusos por parte de policiais militares ou civis, a vítima deve levar o caso à Corregedoria das Polícias. “Elas são responsáveis por receber denúncias e apurar a conduta dos seus policiais. Em alguns casos, a denúncia pode ser feita pela internet”, diz.

Em cidades pequenas, as vítimas podem recorrer à Central de Atendimento à Mulher pelo 180, número nacional disponível 24 horas. “A Central pode ser acionada por qualquer pessoa, de qualquer lugar do país, para receber orientações do lugar mais próximo para receber o atendimento adequado”.

Fonte: IG Mulher

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