Perdemos Marília Mendonça, a mulher que nos ensinou a cantar sobre nós mesmas
Eu ainda nem tinha ouvido falar no fenômeno do feminejo, mas já conhecia o nome dela: Marília Mendonça . O ano era 2017 e todas minhas amigas estavam obcecadas pela mulher que cantava exatamente o que nós vivíamos. “O meu cupido é gari” se tornou um hino toda vez que uma de nós estava afogando as mágoas com o coração partido. O megahit “Infiel” serviu para dar coragem para queimar foto do ex enquanto cantamos que a culpa não era da outra, mas dele, que não ia mudar.
Durante anos, várias mulheres da minha geração buscamos vozes que cantassem aquilo que estávamos sentindo. Mas no começo dos anos 2000, já não era tão fácil se reconhecer nas trágicas canções de amor de divas da MPB ou daqueles cantores que diziam entender a alma feminina.
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Nós queríamos reclamar de relacionamentos com homem “Folgado” e afirmar nossa liberdade; queríamos poder falar da cilada de sair com alguém comprometido como em “Amante não tem lar”, ficar apaixonadas e sentir aquele “Medo bobo”, mandar um shade pro ex que liga de madrugada, dar aquele conselho “Some que ele vem atrás” e jogar na cara da amiga no dia seguinte: “Amiga, você tava bebaça”.
Nessa sexta-feira fomos bombardeadas com a notícia que até agora torcemos pra engano: morre Marília Mendonça. Tão jovem, tão talentosa, auge da fama, filho pequeno. Triste demais pra acreditar. Não só porque se tratava de uma das maiores cantoras brasileiras dos últimos anos. Uma cantora cuja voz surgiu pra mim e pras minhas amigas em um momento de ebulição e auto-descoberta; um momento em que as mulheres não só reivindicavam fortemente questões de ordem política e social, mas o protagonismo em todas esferas de suas vidas. Incluindo no amor.
Marília Mendonça deixa esse mundo no auge da fama. Bem no momento em que a gente começava a retomar os contatos e rever pessoas queridas, com quem certamente iríamos cantar suas músicas a plenos pulmões depois de umas tantas rodadas. Deixa um vazio no coração ao nos lembrar a fragilidade da vida, independente do quanto a gente vive, sofre, chora, ama. Mas com todos esses momentos e hinos que marcaram a minha vida e de tantas outras mulheres, ela deixa também um legado: nós sempre teremos as canções de Marília Mendonça.