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Guterres: crise da pandemia “tem rosto de mulher” e é preciso mudança

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© Mark Garten/ONU

Guterres: crise da pandemia “tem rosto de mulher” e é preciso mudança


O secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, disse que a pandemia está agravando as desigualdades de gênero, que as disparidades salariais entre homens e mulheres aumentaram e que o processo de recuperação é uma oportunidade para reverter a situação.ebcebc

Em artigo publicado no jornal Público a propósito do Dia Internacional da Mulher, comemorado hoje (8), António Guterres escreveu que a pandemia está eliminando anos de progresso em direção à igualdade de gênero, lembrando que as mulheres “têm maior probabilidade de trabalhar nos setores mais afetados”.

“A maioria dos trabalhadores de serviços essenciais, na linha da frente do combate à pandemia, é de mulheres – muitas delas oriundas de grupos racialmente e etnicamente marginalizados e com baixos níveis de rendimento”, disse Guterres.

Ele lembrou que as mulheres são “24% mais vulneráveis à perda de emprego” e “sofrem quedas mais acentuadas de rendimentos”. Acrescentou que “as disparidades salariais entre homens e mulheres, já elevadas, aumentaram, inclusive no setor da saúde”.

“A prestação de cuidados não renumerada aumentou drasticamente devido a medidas de confinamento e ao fechamento de escolas e creches. Milhões de meninas poderão nunca mais voltar à escola”, afirmou o secretário-geral da ONU, frisando que as mães – especialmente as mães solteiras – “enfrentam sérias adversidades e sentem elevados níveis de ansiedade”.

O ex-primeiro-ministro português defendeu que a pandemia desencadeou “uma epidemia global paralela de violência contra as mulheres em todo o mundo”, com aumento significativo de casos de violência doméstica, tráfico, exploração sexual e casamento infantil, e que o mundo precisa de “um novo estímulo à promoção da liderança feminina e da participação igualitária”.

O secretário disse que a resposta à covid-19 evidenciou “o poder e a eficácia da liderança feminina” e linformou que, no ano passado, os países com líderes femininas tiveram taxas de transmissão mais baixas e estão, em sua maioria, “mais bem posicionados para se recuperar desta pandemia”.

“As organizações femininas preencheram lacunas cruciais no fornecimento de serviços e informações essenciais, especialmente em nível comunitário”, defendeu Guterres, acrescentando que quando as mulheres lideram governos se assiste a “maiores investimentos na proteção social e avanços mais significativos contra a pobreza”.

“Quando as mulheres estão no Parlamento, os países adotam políticas mais eficazes de combate às alterações climáticas. Quando as mulheres negociam a paz, os acordos são mais duradouros”, exemplificou.

Para ele, em nível global, no entanto, as mulheres representam apenas um quarto dos legisladores nacionais, um terço dos autarcas e apenas um quinto dos ministros.

“Nesse ritmo, a igualdade de género não será alcançada nos sistemas políticos nacionais antes de 2063. A paridade entre chefes de Estado levará mais de um século”, afirmou Guterres, que disse ter orgulho de ter alcançado “a igualdade de gênero nas posições de liderança das Nações Unidas”.

Defendeu que o processo de recuperação da pandemia é “a oportunidade de traçar um novo caminho mais igualitário” e que as ajudas à recuperação “deverão ser especialmente direcionadas a meninas e mulheres, inclusive por meio de investimentos em infraestruturas associadas à prestação de cuidados”.

“A economia formal só funciona porque é subsidiada pelo trabalho feminino não remunerado”, escreveu Guterres, apelando aos líderes mundiais que atuem em seis áreas estruturais – a representação igualitária, por meio de cotas e outras medidas especiais, o investimento na economia da prestação de cuidados e na proteção social e a redefinição do produto interno bruto de forma a incluir o trabalho doméstico, assim como a remoção de barreiras à inclusão plena das mulheres na economia são algumas das áreas apontadas.

António Guterres defendeu ainda a revogação das leis discriminatórias em todas as esferas e a promulgação, por cada país, de um plano de emergência de combate à violência contra mulheres e meninas, seguido de financiamento, legislação e “vontade política para acabar com esse flagelo”.

O secretário pediu também uma mudança de mentalidade, o aumento da consciencialização pública e que se acabe com “o preconceito sistêmico de gênero”.

“O mundo tem a oportunidade de deixar para trás gerações de discriminação enraizada e sistêmica. É hora de construir um futuro igualitário”, concluiu.

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