Além do cão guia: como funciona o treinamento dos cães de assistência
Muito se fala sobre os animais de terapia ou de assistência emocional, mas existe uma diferença entre eles e é preciso entendê-la bem . Um animal terapêutico é aquele que ajuda emocionalmente um paciente – este pode ser, inclusive, seu próprio tutor – são muito comuns em casas de repouso e hospitais infantis, por exemplo.
Já o cão de assistência, ou cães de serviço, como geralmente são conhecidos, passam por todo um processo de treinamento e são designados para funções específicas. A mais comum entre elas é o cão-guia, que auxilia na locomoção de pessoas com deficiência visual, no entanto, existem inúmeras outras funções nas quais os cachorros são capazes de auxiliar.
Qual é a raça ideal?
O zootecnista, Claudio Fudimoto explica que as raças podem ser as mais variadas, incluindo os cães sem raça definida (SRD). O mais comum é que se usem raças específicas, pois assim é possível traçar um perfil mais adequado a determinadas funções.
“O importante para quem treina esses cães é saber o temperamento do indivíduo. Eles precisam ser cães calmos, assertivos e que tenham energia para trabalhar, mas que não sejam muito agitados”, explica.
Como são escolhidos os animais
Tudo começa com a escolha do filhote. Independente da raça, em alguns casos é feita uma linhagem de cães, que são selecionados pela genética. Os cachorros com essas características são cruzados, para que os genes prossigam nas futuras gerações – em resumo, provavelmente os filhotes de um cão-guia serão treinados para a mesma função, como os pais. Assim é criada uma linhagem de cães própria para tal trabalho.
Uma vez com o filhote selecionado, é preciso um bom treinador para que assim o cão passe por um período conhecido como “estampagem”, que são os cinco primeiros meses da vida do cãozinho. Eles serão cuidados para que o animal não crie possíveis traumas e fobias, desenvolvendo um bom convívio com seres humanos. Após esse processo, os cães passam por um período de socialização, alguns são enviados para lares temporários, aprendendo assim a conviver com os mais variados tipos de pessoas.
Além disso, também é feita uma ambientação para que o cachorro também aprenda a lidar com os mais variados tipos de ambientes: locais agitados, barulhentos, movimentados, entre outros. “Esses cães vão enfrentar diversas situações em seu dia a dia, não será sempre que ele entrará em um hospital calmo. Eles precisam aprender a conviver também com pessoas estranhas para ele”, conta o zootecnista.
O treinamento
Claudio explica que, para cada função existe um treinamento distinto: “Se eu for destinar o cachorro para o acompanhamento de deficientes visuais, o treinamento é diferente para os deficientes auditivos. Assim como para pacientes que sofrem com epilepsia ou diabetes”.
Um cão que acompanha um paciente com diabetes é capaz de identificar a baixa de glicemia, por exemplo. Os cães são treinados por pessoas especializadas para cada tipo de treinamento e então eles são apresentados ao futuro tutor, para que seja realizado também um treinamento para que a pessoa, em um processo conhecido como binômio, para que ambos, cão e tutor, criem um vínculo afetivo.
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Como o animal identifica a alteração no organismo do tutor
O especialista explica que “tudo o que acontece no organismo tem um ‘gatilho’ e, a partir do momento em que é disparado, acontece uma série de reações químicas que, em muitos casos, nós não conseguimos perceber. Tanto os hormônios, como feromônios exalados não são percebidos pelos humanos, porém, os cães, com sua capacidade olfativa, conseguem perceber essas mudanças. Uma vez que nós tenhamos essas substâncias isoladas, nós conseguimos treinar os cães para percebê-las e, assim, ele avisará ao tutor ao primeiro sinal de sintomas”.
Sendo assim, os cães conseguem notar quedas de glicemia ou até mesmo que uma possível convulsão epilética pode estar para acontecer, dando tempo para que o tutor tome as providências necessárias. Para quem precisa de um determinado medicamento, isso pode fazer uma grande diferença.
Os cães conseguem identificar as mais variadas doenças por meio do odor. Para que haja clareza nos sinais de que o cão está identificando um determinado sintoma, cada animal recebe um treinamento específico para cada necessidade. Sendo assim, um animal treinado para auxiliar um paciente que sofre de diabetes não receberá o mesmo treinamento que um animal que acompanhará um paciente que sofre de epilepsia.
Quanto tempo demora o treinamento
O especialista explica que um cão estará pronto para a função em cerca de um ano e meio, ou, dependendo da função, pode chegar a até três anos. Pode variar também de acordo com o animal e com a função para a qual é treinado. “Nós temos que ensinar o cachorro a pensar e tomar decisões por si só. Um cachorro guia, muitas vezes, terá que desobedecer ao tutor, que talvez queira ir por uma direção que o cão notará que pode haver algo obstruindo o caminho, oferecendo risco ao dono. Assim o cão precisa ser desobediente e tomar a decisão de levar o deficiente visual por uma rota segura”.
Quando termina o tempo de serviço
Por maior que seja o vínculo entre o cão de serviço e seu tutor, esses animais, como o nome diz, estão realizando um serviço e, como um bom trabalhador, precisa ter o seu descanso ou aposentadoria, que geralmente acontece quando o animal atinge os 10 anos de vida.
Mas o que acontece com o animal quando ele se aposenta ? O zootecnista explica que a prioridade para a adoção do animal é do atual tutor, caso queira adotá-lo como pet – lembrando que precisará de um novo cão para função de acompanhamento. Caso a pessoa não deseje continuar com o cãozinho, ele entra para uma campanha de adoção, na qual a família que queira adotar o animal, precisa provar que terá condições de propor uma vida digna ao aposentado.
Não interaja com um cão-guia
Os cães são animais sociáveis e, com isso, adoram interagir com as pessoas e outros animais. Mesmo que sejam treinados desde filhotes para lidar com distrações, o mesmo não cabe para as pessoas que cruzam o caminho desses animais, que podem querer interagir. Por isso, Claudio Fudimoto ressalta que, mesmo com esse treinamento eles continuam sendo cachorros e gostam de interagir, por isso é preciso levar ao conhecimento da população que não se deve distraí-los, para não ocasionar problemas para a pessoa que precisa daquele animal. Por mais fofos que sejam, animais de serviço não devem ser distraídos enquanto estão trabalhando.